quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

HELOÍSA NORONHA
Colaboração para o UOL

Dividir a rotina com alguém vai além das delícias de assistir a um DVD juntinhos no sofá ou uma sessão de sexo quente. Há missões inglórias, como pagar contas, lidar com afazeres domésticos e, claro, conhecer intimamente –e a fundo– o outro. Isso inclui odores, sons e visões pouco atraentes. Para explicar com mais clareza: gases, depilação vencida, unha do pé comprida, calcinhas ou cuecas esgarçadas. E quem nunca se descuidou um pouco? O problema é que, com o passar dos anos, os casais tendem a se sentir cada vez mais próximos, deixando de lado certas regrinhas de educação (e de até higiene).

Para Maria Cláudia Lordello, uma das coordenadoras do Projeto Afrodite de sexualidade, da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), é óbvio que a intimidade é importante, pois aproxima as pessoas. "Conhecer bem quem você ama, e saber dos seus segredos e hábitos pessoais, faz parte de qualquer relacionamento. Porém, certos costumes íntimos não devem ser parte da rotina do casal, pois podem acabar prejudicando a relação", afirma a especialista. "Precisamos tomar o dobro do cuidado com as atitudes que envolvem a outra pessoa."

Todo mundo acorda com a cara amarrotada, o cabelo amarfanhado e um hálito nem um pouco refrescante. A noite pode ter sido ótima, mas a realidade das manhãs a dois é essa –e completamente aceitável. Todo mundo elimina gases, porém, ninguém precisa presenciar algo tão íntimo. "Claro que, eventualmente, algumas dessas situações podem ocorrer, pois são fisiológicas. Mas não devem ser um hábito, o que é bem diferente", diz Maria Cláudia. Fazer as necessidades de porta aberta pode e deve ser evitado, assim como ficar com a depilação vencida e usar roupas íntimas velhas e puídas.

Muitas vezes, aquilo que une o casal no início do relacionamento será o que vai separá-los no final. Falando de intimidade, isso costuma acontecer bastante, já que aquela pessoa passa a ser conhecida demais e não oferece mais surpresas ou novidades –como admirar o capricho em se arrumar para uma festa, por exemplo, se a mulher se vestiu, se maquiou, passou fio dental e fez escova na sua frente? Para o romance durar, é preciso surpreender e mostrar que sempre há algo novo para ser descoberto.
"A familiaridade proporciona segurança, mas descarta o entusiasmo e a emoção", diz a terapeuta sexual e de família Sylvia Faria Marzano, diretora do Isexp (Instituto Brasileiro Interdisciplinar de Sexologia e Medicina Psicossomática), com sede em São Caetano do Sul (SP).

"Casais que já se relacionam há mais de dez anos têm tendência a dar muito valor para o que sabem um do outro e costumam fazer uma previsão do que a outra pessoa vai pensar ou fazer, justamente por conhecê-la tão bem. Mas o erotismo gosta do imprevisível. Como desejar algo que já podemos prever? O grande trunfo para que o desejo não diminua ou termine é o mistério, a novidade, a incerteza.”

A dica de Sylvia vale para rituais de higiene e de beleza. "O quanto erótico é soltar gases e outras coisas que só se faria com um amigo nos tempos de escola? Dormir com um certo preparo –de banho tomado, com um pijama bonito, tanto da parte da mulher quanto do homem– é um cuidado que todos devemos ter, por nós mesmos", diz Sylvia Marzano.

Mas ela comenta, ainda, que os casais não precisam "ser de mentira", fingindo que a fisiologia não existe. Porém, é preciso ter bom senso quando algum mico acontece, para que isso não seja motivo de diversão imatura e nem de constrangimento.
 
Nem oito, nem 80 O extremo oposto –nunca tomar banho de porta aberta ou aparecer na frente do marido sem maquiagem, por exemplo– também é ruim, pois significa ausência de intimidade. "Um relacionamento superficial não é o que as pessoas esperam ao procurar estar ao lado de alguém. É preciso conhecer intimamente a pessoa com quem você divide a vida, aceitá-la do jeito que é e sentir-se aceito", afirma a psicóloga Maria Cláudia Lordello.

A terapeuta Sylvia Marzano lembra que há casais que não têm nenhuma intimidade, principalmente se um deles vem de uma família repressora, em que ter prazer era pecado ou indigno. “Isso também faz com que não haja entrega dos parceiros para um bom relacionamento sexual”, diz ela, que aconselha: “O ideal é buscar uma distância essencial, pois o casal que tem uma convivência física constante tem uma inibição do apetite sexual. Cuide para que a afeição não abafe o tesão.”