quarta-feira, 8 de junho de 2011

CRÔNICA AMORX CASAMENTO -MANOEL CARLOS

VI ESTA CRÔNICA E GOSTEI MUITO RESOLVI POSTA-LA
Com raríssimas exceções, todos os meus amigos já passaram por vários casamentos, sendo que o Renato – que eu conheço há quarenta anos – já está no quinto contrato nupcial. Segundo algumas pesquisas que andam por aí, as separações acontecem mais entre o sétimo e o décimo ano de união. Com o meu amigo os fatos contrariaram os índices, já que a melhor marca que ele conseguiu foi de dois anos de permanência sob o mesmo teto.
– Não sei explicar – me diz ele –, mas depois de um certo tempo me bate uma impaciência, uma intolerância, vendo aquela mulher ali, ao meu lado, dia e noite... minha privacidade indo pra cucuia...
Contesto esses argumentos. Afinal, uma mulher ao lado, dia e noite, pode ser a felicidade suprema, e, se isso leva meu amigo ao desespero e, conseqüentemente, ao fim do casamento, é simplesmente porque falta amor em suas relações. E digo isso a ele, com todas as letras:
– Você nunca amou! Da primeira à quinta!
– Você é que é um animal anacrônico – me devolve ele, já entediado. – Um sentimental, um romântico. A tendência do mercado matrimonial é acabar definitivamente com o casamento. Instituir a pluralidade nas relações homem-mulher. Desqualificar a infidelidade e a culpa. Institucionalizar o verso da canção popular que diz: "Ninguém é de ninguém, na vida tudo passa".
Desisto. Como discutir com alguém que usa a expressão "mercado matrimonial"? Está certo que o Renato trabalha na bolsa de valores, em São Paulo, mas nem assim se justifica. Constato tudo isso com imensa tristeza. Sempre achei que casamento deve ser mesmo pra vida inteira, eterno, como diz o padre, ou seja: até que a morte, só ela, separe o casal. Renato sorri e dispara:
– Amor eterno? Olhe, cara. Nunca me esqueci de uma frase da personagem de Jodie Foster no filme Neblina e Sombras.
– Vai, diz logo. Qual é a frase?
– "Só há um tipo de amor que dura e pode ser eterno: o amor não correspondido."
Esse Renato é mesmo impossível, ainda que eu ache a frase, aqui entre nós, de grande inspiração, e até vou procurar ver esse filme.
Fico menos horrorizado quando a separação é consensual e cada um segue pro seu lado, aliviado e ansioso por encontrar a felicidade que não conseguiu antes; mas, quando o rompimento é unilateral, ah!, como isso faz sofrer. Tenho nas minhas relações um amigo e uma amiga nessa situação. Ele um dia chegou em casa e encontrou a mala pronta, junto à porta, e a mulher no centro da sala, ao lado dos pais, o dedo em riste e o olhar duro indicando que ele dali não passasse. Pobre Eduardo! Não estranhou a separação, mas o modo como ela se deu. Já esperava pelo fora, estava carregado de culpa, a mulher já lhe dera um flagrante com uma prima em segundo grau. Mas, mesmo assim, era apaixonado pela sacrossanta mãe dos seus dois filhos. A prima não passara de uma tentação irresistível, um velho desejo juvenil até então recalcado, embalado por uma garrafa de champanhe tomada no gargalo. Que tristeza jogar fora um casamento por uma hora de prazer.
– Não foi nem tanto assim. Não passou de miseráveis vinte minutos! – me disse ele na mesma noite em que foi despejado e apareceu aqui em casa, mortificado, lacrimejante. E continuou:
– Poderia ter passado sem isso, não me acrescentou nada. Perdi a Marta (Marta é o nome da "falecida") de burro. Troquei minha mulher por coisa nenhuma.
Esses arrependimentos são comuns. E tardios. Eduardo já está comemorando o primeiro aniversário da separação e ainda tem um esgar de amargura cada vez que ouve alguém falar em casamento e felicidade.
O caso da minha amiga Maria Cecília é diferente. O marido simplesmente "plantou" a secretária em outro apartamento e começou a ter vida dupla. Quando ela soube e, em meio a alguns tabefes e muitas lágrimas, gritou a famosa frase "Ou ela ou eu!", o marido optou pela outra, a filial, encerrando a atividade da matriz. Só Deus e eu sabemos o que Maria Cecília chorou, sofreu e engordou. Sim, porque existem duas maneiras de se mostrar infeliz: comendo muito ou não comendo nada. Quando a humilhação do brutal rompimento desapareceu, Maria Cecília se desesperou diante do espelho. E comentava com amargura:
– Tenho amigas que ao se separarem ganharam gordas pensões. Eu... engordei 23 quilos! Isso eu jamais perdoarei ao Jerônimo!
Que os meus prováveis leitores não pensem que tento, com esta crônica, desqualificar o casamento e abraçar a tese do Renato. Sou um homem feliz, às vésperas de comemorar bodas de prata. Sou a favor, repito, das uniões eternas, geradoras de filhos, com direito aos ruidosos almoços de domingo e caminhadas no calçadão do Leblon, de mãos dadas. Que não pensem também que o tema me ocorreu por influência da badalada união de Angélica e Luciano. Não. O que me levou a pensar em amor e casamento, duas coisas que podem ser totalmente distintas, mas que quando somadas produzem a tal Felicidade com F maiúsculo, foi ter assistido ao belíssimo filme de Daniel Filho A Dona da História, que ninguém deve perder e que conta com um elenco primoroso, com destaque para Marieta Severo, a dona não apenas da história, mas do cinema brasileiro.

Nenhum comentário:

Postar um comentário